A Coelce (Companhia de Eletricidade do Ceará) foi privatizada dia 2 de abril de 1998 na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro por R$ 987 milhões. O leilão teve um ágio de 27,2% sobre o preço mínimo de R$ 775,96 milhões. O consórcio Distriluz, formado por empresas do Chile, da Espanha e de Portugal, que controla a Cerj (Companhia de Eletricidade do Rio de Janeiro), venceu o leilão cujo contrato foi estabelecido em 30 anos, até 2028.
Era governador na época, o hoje senador Tasso Jereissati (PSDB) e o presidente da Companhia, Jurandi Picanço. Edilton Soarez, então secretário da Fazenda, contratou assessoria privada para ajudar no processo de privatização: a consultoria Internacional Finance Coorporation.
No ano anterior, 1997, a Assembleia Legislativa autorizou a privatização da Coelce por 29 votos a favor e 14 contra, numa sessão tumultuada, no mês de setembro. A Associação dos profissionais ligados à Companhia se expressou, através de uma carta aberta à sociedade, contrária à privatização. Carência de legislação reguladora, dúvidas quanto à posição do investidor privado e a repercussão no preço da energia elétrica eram as principais preocupações.
A Cerj – que em fevereiro de 1998 tinha sido multada em R$ 638 mil pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) por queda na qualidade dos serviços no Rio – adquiriu diretamente 36,6% da parcela leiloada (82,69% do capital votante da Coelce, correspondentes a 51,05% do capital total). O presidente da Enersis, José Antonio Guzmán Matta, disse que os problemas de qualidade dos serviços enfrentados pela Cerj não iriam se repetir na Coelce.
O resto das ações foi comprado pela espanhola Endesa (37,5%) e chilena Enersis (26%). Enersis e Endesa dividiam com a portuguesa EDP o controle da Cerj. A empresa chilena tem 42% do capital da distribuidora fluminense, a EDP, 21%, e a Endesa, 7%.
Em setembro de 2000 apareceu, na Câmara Federal, a primeira ameaça de cassação da concessão motivada por apagões, oscilação de voltagem, queima de aparelhos e morte de 17 pessoas pela má qualidade dos serviços. A Coelce já tinha sido multada pela Aneel em R$ 500 mil reais.
Em junho de 2001, o governo do Ceará utiliza R$ 150 milhões da privatização para financiar o déficit primário no Estado. Também em junho é realizada na Assembleia Legislativa audiência pública para saber onde o dinheiro da venda da Coelce foi utilizado. O governo tinha prometido que o dinheiro seria para criar um fundo de pensão para os servidores estaduais, mas o projeto não saiu do papel.
Em janeiro de 2009 a empresa italiana Enel assume o comando da Endesa e o controle da empresa distribuidora de energia do Ceará.
Em novembro de 2016 a Coelce passa a se chamar Enel.
A partir de 2021 começam a piorar, acentuadamente, os serviços da empresa. Tanto que ela teve que devolver R$ 18,3 milhões aos clientes cearenses para compensar falhas no serviço no exercício de 2020.
O cenário atual
A Secretaria Executiva do Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon) do Ceará informou (12/12) deste ano que vai instaurar procedimento administrativo para apurar infrações da Enel ao Código de Defesa. São várias as irregularidades apontadas pelos clientes, segundo informou o promotor de Justiça, Hugo Xerez, secretário-executivo do Decon.
“Recebemos, diariamente, reclamações dos consumidores. Existe um posto de atendimento da Enel no Decon e essas demandas que chegam às vezes elas são resolvidas espontaneamente pela Enel, ocorre que o número é tão grande que a Enel não consegue atendê-las. A despeito da existência de um posto da Enel dentro do Decon, esse trabalho poderia ser mais eficiente”, disse Hugo.
E complementou: “Poderia ser mais eficiente se a Enel implantasse seu serviço de Ouvidoria e que ela mesma prestasse esse atendimento. Muitas vezes o consumidor tem que recorrer ao Decon, depois de apresentar uma demanda no serviço de atendimento ao consumidor que a Enel tem por obrigação manter, porque essa demanda ela não foi aceita (pela empresa). Se nós analisarmos com frieza, os números de reclamações do Decon contra a Enel são até baixos”.
Informou ainda o promotor de Justiça que a Enel será notificada das irregularidades esta semana e terá prazo de 20 dias para apresentar defesa. Caso as ponderações da concessionária não sejam acatadas pelo órgão do MP, será aplicada multa que pode chegar a 3 milhões de UFIRCE, o que equivale a R$ 15 milhões.
Sete irregularidades principais
– Descumprimento das obrigações constantes no contrato de concessão.
– Piores indicadores do país nos índices de distribuição de energia (DEC e FEC).
– Líder em reclamações da população do Ceará e Região Nordeste (Sistema Nacional de Informações e Defesa do Consumidor (SINDEC) e na plataforma “consumidor.gov.br”).
– Corte indevido de energia e emissão de fatura duplicada.
– Reclamações constantes do setor produtivo sobre demora na ligação de energia de empreendimentos.
– Maior aumento na tarifa de energia do País (24,85% neste ano).
– Tentativa de aumentar a taxa que os provedores de Internet pagam por usar os postes.